Você já deve ter ouvido esse termo antes, e até pensado que sabe exatamente o significado do que significa uma falácia. E que existem mais de 50 tipos de falácias. E que algumas são coerentes com as outras de tal forma que criam até círculos viciosos.
Sim, falácias são simples e complexas ao mesmo tempo, podem fazer seu interlocutor um objeto de admiração, quando na verdade o que ele está fazendo é manipular informações e pessoas para aquilo se ajustar ao que ele deseja que seja, e não como realmente são os fatos.
Vamos explorar um pouco mais do que seria uma argumentação histórica e expor as premissas de algumas falácias e princípios, e assim, para quem não é, ou é, da área histórica/arqueológica, possa compreender melhor afirmações e novas propostas históricas que aparecem em artigos científicos ou até num tiktok aqui, ou reels alí...
A História da Falácia
A origem filológica da palavra falácia vem do equivalente grego “fallacia” , que significa: aquilo que engana ou ilude, sendo assim, uma falácia compreende-se como algo enganoso. Falácias também podem fazer parte de sofismas, ou seja, raciocínios elaborados maliciosamente para enganar o interlocutor, ou até em paralogismos, o mesmo que raciocínios falsos.
A diferença reside aí, nem sempre o interlocutor é consciente sobre aquilo que faz, e pensa estar correto em sua linha de raciocínio, criando o que chamo de sofisma VERSUS paralogismo. Nada que bons estudos e aplicação de práticas científicas de raciocínio lógico não resolvam.
Portanto é correto compreender que as falácias são criadas por raciocínios, aparentemente, certos, no entanto, que resultam em falsas conclusões. Isso é um risco para o revisionismo histórico, pois pode gerar as mais mirabolantes hipóteses, que por sua vez, não têm como ser comprovadas. Acontece que pessoas com baixo nível de conhecimento da área, acabam iludidas com fantasias maravilhosas de um mundo que nunca tenha existido.
A origem do latim vulgar derivado do grego, teve um dos seus primeiros exploradores sob o nome do filósofo grego Aristóteles, o primeiro que se tem registro a se aprofundar na identificação e catalogação desse tipo de pensamento. A partir de Aristóteles e a evolução do pensamento, hoje, as falácias são vistas como uma falha de raciocínio criada em conjunto com uma argumentação inconsistente derivada de falta desconhecimento, e as vezes, de mau-caratismo.
Falácias e a História
Uma habilidade que é imprescindível ao ler sobre história, ou assistir sobre o tema ou escrever sobre o passado da humanidade, é saber identificar falácias em suas mais diversas cores, formatos e aromas, seja em roteiros ou livros. Para conseguir identificar as falácias nos argumentos, primeiro precisamos olhar o que constitui um argumento, seja ele proferido por você, ou por quem quer que seja.
Novas propostas e hipóteses no campo do estudo da história necessitam da criação de argumentos para que o observador externo seja convencido de que a nova proposta é válida. Esses argumentos devem ser baseados em fatos, artefatos, e outras evidências que conseguimos durante a pesquisa. É importante entender que esses argumentos devem ser resistentes às provações, haja vista que toda proposta passa por análise de vários profissionais das mais diversas áreas, para então ser entendida como uma hipótese válida. O intuito disso é excluir vieses cognitivos, razões pobres ou falácias de alguma forma, prevenindo que você seja inadvertidamente enganado por algo que não tem uma fundação sólida.
ARGUMENTO: portanto, é um recurso da linguagem empregado na defesa de um ponto de vista acerca de um assunto em situações de debate e discussão de ideias.
E em se tratando de retórica existem diferentes graus de argumentos empregados nas referencias da criação de um raciocínio.
O primeiro grau seria os Argumentos Fortes, aqueles que validam a informação, afim de garantir a sua veracidade.
O segundo grau, enquadra os Argumentos Fracos, ou seja, os argumentos que não conseguem comprovar uma afirmação ou criar uma conclusão, e ainda assim, conseguem deixar o argumento rotulado como algo passível de ser verossímil.
Não menos importante para este artigo, temos os Argumentos Falaciosos, aqueles que apresentam grandes erros na linha de raciocínio, porém, a depender do tipo e nível do público que é apresentado, acaba sendo tido como correto. Sendo assim, a falácia histórica consiste em declarações que parecem razoáveis num primeiro contato, porém, sob uma ótica lógica e criteriosa, não se sustentam, são irrelevantes, ou não fazem sentido.
Ao saber identificar esses pontos nos discursos, com o tempo, você deixará de ser iludido com esse tipo de argumentação. E em contrapartida, passará a não usar justificativas desse tipo nos seus próprios pontos de vista sobre determinados assuntos, criando assim um ótimo senso crítico totalmente fundamentado em fatos e coerência.
VAMOS AOS PINGOS NOS I's
Há dezenas de tipos de falácias, e aqui exploraremos algumas das mais comuns no campo dos estudos científico, dando foco na história geral e mistérios que rondam o imaginário histórico das pessoas, profissionais e amantes dos fatos do passado.
1. Falácia da Generalização Apressada:
Em geral esse tipo de falácia carrega argumentos sobre algo, tal como eventos históricos importantes ou ideias e são baseados em apenas um fato, ou poucos. Por vezes, o argumento tem poucos exemplos para suportar a hipótese. Por exemplo, não é porque duas culturas de tempo e local distinto utilizam grampos de metal entre seus blocos para construir muralhas, que necessariamente houve algum tipo de contanto entre elas.
Sim, pode ter havido tal contato, mas apenas uma semelhança arquitetônica não basta parar comprovar o contato entre povos, a conclusão precipitada não demostra estudos mais aprofundados na cultura, credos religiosos e interação social de ambos os povos para compreender se de fato poderia ter ocorrido a aparição simultânea da tecnologia em várias partes do mundo, sem que haja o contato direito.
O argumento não justifica a hipótese por si só, e não tem base para carregar uma conclusão, pois, apenas um ponto observado, não constrói um argumento sólido.
Lembrando aqui que teorias são um conglomerado de hipóteses já testadas e comprovadas. O que é um outro exemplo de como a oratória pode manipular o consumidor de material histórico, haja vista que, por vezes, a palavra teoria é utilizada no lugar de hipótese, e para a ciência, isso muda completamente a abordagem da compreensão.
2. Falácia da Falsa Causalidade ou Falsa Causa
A falácia da falsa causa é um tipo retórica que se utiliza da argumentação da causa e efeito, ou seja, estabelece uma relação casual para um efeito de espera, sempre entre dois elementos, no caso da história, de dois eventos. Na maioria das vezes, se estudada e analisada, até de forma superficial, chegamos á conclusão que essa relação não existe. Veja a seguir:
Houve um cataclismo, e o cataclismo destruiu tal civilização. E porque não há provas da existência da civilização, porque houve um cataclismo que a destruiu. Porém, aí vem a questão: então como sabemos que houve uma civilização, se tudo que existiu dela foi destruído por um cataclismo?
Posterioridade em si não é prova de fatos, apenas um fator dentro do leque de fatores possibilidade de argumentos, neste caso, fracos e falaciosos.
Uma forma de evitar esse tipo de argumento é não dar maior atenção para o argumento em si, mas vasculhar os arredores do que ele envolve, procurar por evidências comprováveis e compreender o todo sob todos os aspectos que envolvem o assunto, não apenas o fato em si.
3. A Falácia dos Historiadores ou Viés de Retrospectiva
Por vezes esse tipo de falácia, quando se trata de fatos históricos, divulgadores ou até não especialistas tendem a justificar ocorrências ou conclusões de hipóteses propostas segundo a opinião de figuras históricas, tal como se essas figuras históricas tivesse o mesmo nível de propriedade científica que historiadores ou arqueólogos têm na atualidade. Daí então vem o nome, viés de retrospectiva.
Com a busca por audiência, veículos de comunicação e divulgadores de mídias sociais acabam por não terem conhecimento suficiente para interpretar o que vê e analisa, sendo assim, informações equivocadas e conclusões precipitadas são passadas para o público em geral em toneladas.
Tais figuras históricas usadas como referências de veracidade, acabam por compreender que o significado dos eventos relatados não se torna aparente até a posteridade e ao mesmo tempo a atualidade, ou seja, quando é capaz de observar os acontecimentos a partir da perspectiva do presente, e não durante o tempo em que fato acontecia, no passado. Dessa forma, não há como uma testemunha ter consciência e servir como fator de comprovação, pois não estava ciente do que ocorria durante seu tempo de vida.
Essa falácia do historiador também é cometida quando uma pessoa, um observador avalia decisões tomadas no passado com olhos modernos.
“Qual seria o motivo dos egípcios gastarem tanto tempo, energia e esforço para construírem túmulos tão impressionantes? Não faz sentido! Deve haver algum outro motivo!
Pois bem. Essa é uma visão curta sobre um ponto isolado: as pirâmides egípcias. Não considerando a cultura, o meio social, a composição hierárquica, os ritos religiosos e contexto em geral. Concluir algo sem usar algo que possa ajudar a evitar cair em falácias ou vieses, ou seja, o método científico de avaliação, é o mesmo que viajar no tempo para o futuro daqui 2 mil anos, e olhar as pessoas perguntando: por que os antepassados construíam casas tão gigantescas para apenas uma ou duas pessoas? É ilógico. Como pode isso?
Você saberia que é simplesmente pelo motivo do milionário do presente ter o poder aquisitivo e poder ter a casa que quiser e onde desejar. Mas num futuro sem classes sociais, não teriam pista do que pensar, se não avaliarem todos os aspectos do contexto e momento histórico.
4. A Prova Possível
Esse tipo de falácia é a mais um exemplo de argumento pobre, onde o proponente do argumento tenta provar que algo existiu através de algum evento que de fato aconteceu e já tem provas para isso. Sempre justificando que o primeiro evento tem potencialidade de ter existido, mas que na realidade não tem ligação direta se avaliado mais fatores ao redor do contexto das premissas do argumento.
Logo, argumentar que pode ter acontecido, não prova que aconteceu.
5. Falácia do Espantalho
Já a falácia do Espantalho, ou argumentação do espantalho, é comum ser vista em embates políticos durante campanhas eleitorais, e não é nada diferente quando o assunto é história. Ela ocorre quando um opositor a alguma hipótese tenta ridicularizar a imagem da pessoa que propôs o primeiro argumento, apenas com o objetivo de ataque pessoal, isso desvia a atenção do observador. Entretanto, o erro está aí, o oponente à tese ou hipótese não tem argumentos suficientemente fortes ou verdadeiros para opor contra os argumentos. Então, o jeito é conseguir uma forma de criar a falácia que mais se encaixa na ocasião, e isso incluir simplificar ao máximo ou pelo contrário, extrapolar, exagerar, sobre o argumento do proponente, dessa forma tentando transformar e mudar o argumento inicial a um nível quase idiota. Ou seja, não houve contra-argumento, apenas a tentativa de ridicularizar a pessoal ou hipótese.
E para bons observadores, perceberão que o argumento inicial não foi sequer tocado, e o argumento é tão válido que o opositor não tem respostas a altura para contra-atacar, e assim faz birra intelectual com jogo de palavras e tratativa retórica para convencer seu público.
Enfim, a gama de falácias é gigantesca e não cabe em livros completos, então num mero artigo podemos citar apenas alguns dos mais comuns vistos aqui e acola. Parte da identificação vem da bibliografia para esse pequeno artigo e as palavras do Dr. Jason Lepojärvi, um PhD nos estudos de teologia e religiões canadense que atual como professor da Universidade de Helsinki, Finlândia. Ele estuda a nuanças entre o raciocínio lógico e potencial psíquico humano em manipular e ser manipulado. É também estudioso especialista em dois autores contemporâneos entre si das retóricas e potencial de prosa no campo do ilusionismo verbal, são eles C. S. Lewis e Tolken, além de Anders Nygren, e St. Augustinho.
Em suas palestras Lepojärvi sempre deixa claro como a prosa indutiva consegue realizar desejos pessoais dos leitores e como se deixam levar e acreditar em tudo aquilo que querem acreditar.
Felizmente, a realidade é melhor que a ficção, e história não consiste em acreditar, mas sim em estudar e provar, e para separarmos isso na historiografia é necessário boa dose de bom senso, seriedade nos estudos e senso critico. E é isso que o Almanaque Arqueohistória propõe ao leitor.
Boas pesquisas, jovens padawans.
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Bibliografia
AUDI, Robert. The Cambridge Dictionary of Philosophy. New York: Cambridge University Press, 1999.
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. Trad. Alfredo Bosi e Ivone Castilho Benedetti. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
LEPOJÄRVI, Dr. Jason. Palestra diversas.
COPI, Irving M. Introdução à Lógica. Tradução de Álvaro Cabral. São Paulo: Mestre Jou, 1974.
JOSEPH, Horace William Brindley. An Introduction to Logic. Oxford: Claredon Press, 1906.